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A cara feia de Ganso para João Pedro no empate sem gols do Fluminense com o Cruzeiro suscitou discussões sobre a personalidade forte do meia. De fala mansa e educado, o camisa 10 tem colecionado destemperos nos últimos jogos, ainda que as pessoas que o acompanham no dia a dia no Tricolor mantenham que esse não seja um comportamento recorrente. E se parece ter momentos de “bad boy” para a opinião pública, internamente o jogador segue como um dos líderes do vestiário e mantém ótima relação com elenco, funcionários, comissão técnica e diretoria.

Agora, essas explosões em campo não são fruto da temporada tensa que ele e o Flu vivem. Desde cedo que o supostamente tímido paraense se revela intempestivo. Ao lado do desbocado e debochado Neymar, o meia sempre era visto com o quieto da turma. Vem daí a estranheza do público quando o jogador tem seus deslizes. Mesmo que incidentes assim já tenham acontecido em seus tempos de Santos.

 
 
 

A visão, entretanto, é de fora para dentro. Por onde passa, o jogador coleciona muito mais amigos que problemas. O portal UOL Esportes ouviu ex-treinadores e antigos companheiros de Paulo Henrique Ganso. Nenhum deles criticou a postura ou desvio de conduta do jogador, elogiado pela tranquilidade e competitividade. Todos, entretanto, lembraram breves, mas marcantes destemperos do jogador, considerados normais pelo Fluminense.

Menino “rebelde” no Santos

Em 2009, em empate com o Goiás no Campeonato Brasileiro, o meia ainda conhecido como Paulo Henrique Lima protagonizou discussão com Fábio Costa. Na ocasião, o “rebelde” foi defendido por alguns veteranos como Roberto Brum, Rodrigo Souto e Fabiano Eller, que impediram que o polêmico e veterano goleiro chegasse às vias de fato com o jovem no vestiário.

O episódio caiu no esquecimento até a final do Paulista de 2010, contra o Santo André, no Pacaembu. Contrariando o técnico Dorival Júnior, que iria substituí-lo nos minutos finais da decisão, Ganso, que tinha grande atuação, se recusou a sair de campo. Após o jogo e o título do Santos, o treinador saiu em defesa do jogador, valorizando sua vontade de vencer. Muita gente, entretanto, passou a reparar no comportamento diferente e na personalidade forte do meia.

Referência no Fluminense

Ao chegar ao Fluminense com pompa, quase dez anos depois, Ganso recebeu o carinho que lhe faltou no futebol europeu, onde fracassou. Mas a recepção calorosa no aeroporto e os gritos na arquibancada chegaram a virar vaias em seu pior momento. A situação do time na tabela, lutando para escapar da zona do rebaixamento por boa parte de sua campanha até aqui, também não ajudou.

Até que, em duelo com o Santos em setembro, Oswaldo de Oliveira, a bem da verdade, já sabia que nem uma vitória o manteria no cargo. Irritado com atitudes que considerou indolentes do jogador, tentou jogá-lo aos leões ao substituí-lo no empate.

Mas a torcida, que já vaiava o treinador desde o início do jogo, não gostou da mudança e passou a chamá-lo de burro, bem antes da discussão com o meia. A atitude de peitar o técnico, que nunca contou com a aprovação da arquibancada, jogou ao seu favor, e os torcedores voltaram a abraçá-lo. Na zona mista, naquele dia, negou a versão do comandante, que declarou ter sido xingado.

Com o trabalho mal avaliado e outros problemas internos, Oswaldo acabou demitido no dia seguinte. Rapidamente o camisa 10 passou a ser visto como o pivô da decisão, o que o presidente Mário Bittencourt negou veementemente em coletiva de imprensa. Ganso foi multado pela atitude, mas seguiu como líder do elenco e voz marcante no vestiário.

Discussão com João Pedro e liderança no elenco

Por isso, a discussão com João Pedro foi vista com normalidade no clube. Explosivo e exigente, também consigo mesmo, o meia conversou de maneira tranquila com o jovem no vestiário, com os ânimos mais calmos. O atacante ouviu atentamente e se manteve ao lado do agora “polêmico” veterano na volta para o intervalo. No segundo tempo, voltaram a trocar palavras normalmente. No voo de volta de Belo Horizonte rumo ao Rio de Janeiro, sentaram-se próximos e conversaram.

“Isso é para ajudá-lo, assim como outros garotos que estão aí. Faço de tudo para ajudá-los e ajudar nossa equipe. Dentro do jogo não dá para pedir: ‘Por favor, João Pedro, não faça gracinha’. Ainda mais nesse jogo quente. A gente precisando do resultado acontece essa forma de falar. É do jogo. Depois estamos sempre brincando. Eu converso muito com ele fora de campo também”, declarou Ganso, na saída do Mineirão.