Na véspera do primeiro Fla-Flu do ano, a gente escreveu aqui na Flupress sobre como seria importante, em alguns jogos, a flexibilização do modelo de jogo do Fluminense.
Naquele post, a Flupress também colocou uma definição de Sampaoli, segundo Marcelo Bielsa, que reproduzirei novamente e que possui completa relação com o que será escrito neste texto.
Bielsa afirma que Sampaoli é melhor treinador do que ele. E explica: “Uma das virtudes dos treinadores é a flexibilidade. Quer dizer, não se apaixonar pelas suas próprias idéias. Mas você precisa ser apaixonado por suas ideias para convencer seu grupo, então é preciso uma mescla entre humildade para não ser soberbo e jamais mudar sua ideia e uma necessidade de convicção para defender a ideia que você escolheu.”
Vale demais pro Fernando Diniz essa tese.
Bielsa continua: “Eu não cedo nas minhas ideias, e eu não digo isso como uma virtude. É um defeito. Sampaoli, sim, cede nas suas ideias, porque tem um poder de adaptação que eu não tenho”.
Dito isto vamos aos dois últimos grandes jogos vencidos pelos Santos.
Santos 1 x Corinthians 0 (Semifinal do Campeonato Paulista – o Santos perdeu nos pênaltis)
Posse de bola: 68%
Finalizações: 23
Passes 473, sendo 38,7% no terço ofensivo.
Desarmes: 24, sendo 41,7% no meio/ataque.
Sampaoli para este jogo escalou a seguinte equipe: Vanderlei, Ferraz, Felipe Aguilar, Gustavo Henrique e Pituca. Alison, Sanchez, Cueva, Jean Motta e Soteldo. Derlis Gonzalez na frente.
Reparem bem, temos nesta equipe, 1 lateral direito, 2 zagueiros, 2 volantes de origem (Alison e Pituca, que fez o lado do campo), 4 meias e 1 atacante de origem. São 6 meio campistas no total, claro que com diferentes características entre eles, uns mais defensivos, outros mais ofensivos, uns marcadores, outros organizadores e outros que jogam de forma mais vertical como o baixinho Soteldo.
Saída em linha de 3, marcação alta, muita movimentação entre os meias, inclusive com o Vitor Ferraz vindo jogar por dentro, movimento que já vem fazendo mesmo antes da chegada de Sampaoli.
Foi um massacre. O Santos amassou o Corinthians e impôs um raro domínio quando jogam dois times do mesmo quilate.
Veio a estreia do Campeonato Brasileiro, contra o Grêmio, um time pronto, com um treinador há bastante tempo no clube e cujo modelo, já se mostrou vencedor e bastante competitivo. O Grêmio de Renato é um dos times que mais gosta da bola no Brasil.
Grêmio 1 x 2 Santos
Os números são do Santos (comparem com o jogo anterior)
Posse: 39,3%
Finalizações: 8
Passes: 255, sendo 25% no terço final.
Desarmes: 21, 36,9% entre o meio e o ataque.
Escalação do Santos: Vanderlei, Ferraz, Gustavo Henrique, Aguilar, Lucas Veríssimo e Jonatan. Pituca, Jean Lucas, Jean Motta e Soteldo. Eduardo Sasha.
Foram 4 mudanças em relação ao jogo contra o Corinthians, mas a grande mudança foi tática.
O grêmio joga com 2 atacantes abertos (Alisson e o ótimo Everton), com Maicon e Jean Pierre por trás e o André no meio dos zagueiros.
Sampaoli então usou os 3 zagueiros e passou, sem a bola a defender com linha de 5 quando o Grêmio entrava no seu campo defensivo.
Um modelo que fez muito sucesso com o Chelsea de Antonio Conte (campeão da Premier League) e que tem um ótimo antídoto contra times que jogam com 2 jogadores abertos, que é última linha defensiva com 5 jogadores.
A explicação para esse tipo de situação é simples: Times que jogam com dois jogadores abertos e habilidosos no 1 contra 1, normalmente, preparam seu ataque pra que essa bola chegue nesses caras abertos.
Com 3 zagueiros, mesmo com a vantagem pra cima dos laterais, você consegue a cobertura de um zagueiro, mantendo ainda, outros dois dentro da área, algo que não ocorre quando se joga em linha de 4.
Assim, o Santos conseguiu anular boa parte dos ataques do Grêmio, sofreu pressão no segundo tempo, quando Luan e Tardelli saíram do banco, mas nunca deixou de ameaçar seu rival.
No fim, vitória e 6 chances claras criadas contra 7 sofridas no melhor jogo da primeira rodada do campeonato brasileiro.
Vale lembrar que flexibilizar o modelo, não é abdicar de todos os seus conceitos.
O Santos, por exemplo, manteve a intensidade na marcação (veja os números de desarmes nos dois jogos), manteve a pressão alta quando teve essa possibilidade e fez o jogo vertical e associativo que caracterizam os times de Sampaoli.
Santos e Grêmio são os próximos adversários do Fluminense.
Diniz não conseguirá jogar com posse de bola acima dos 60%, trocando mais de 500 passes. O Fluminense sofrerá uma pressão muito grande que já sofreu em alguns jogos esse ano e teve bastante dificuldade.
O Fluminense não está no estágio de Santos e Grêmio. Reconhecer isso é o primeiro passo para planejar as estratégias para esses dois jogos.
O campeonato brasileiro exige dos treinadores e jogadores essa capacidade. Entender as partidas, saber o que é preciso fazer para vencer cada uma das 38 decisões que se apresentam.