(Foto: Marcelo Gonçalves - FFC)

Em campanha de recuperação, o Fluminense deixou o Z4 do Campeonato Brasileiro na 24ª rodada ao vencer, fora de casa, o Atlético-MG, por 2 a 0. Em sua coluna no O Globo, o jornalista Carlos Eduardo Mansur destacou a volta por cima tricolor sob o comando de Mano Menezes como um caso à parte das mudanças de técnicos no decorrer da competição.

Destaca o colunista que uma das grandes críticas às diretorias dos clubes é fazer mudanças muito radicais nos perfis dos treinadores. Algo que parecia ser o caso do Fluminense ao demitir Fernando Diniz e optar por Mano Menezes. Confira abaixo a publicação de Mansur no O Globo:

 
 
 

“O Fluminense desafia os manuais do Campeonato Brasileiro

Uma das críticas mais recorrentes feitas a clubes que trocam de treinador no Brasil é a brutal diferença de perfis entre o substituído e o substituto

Um dos aspectos mais fascinantes do futebol é a frequência com que desafia verdades estabelecidas. O Fluminense, em plena reação no Campeonato Brasileiro, é o exemplo da vez.

Uma das críticas mais recorrentes feitas a clubes que trocam de treinador no Brasil é a brutal diferença de perfis entre o substituído e o substituto. De fato, dizem as cartilhas de boas práticas que impor a jogadores mudanças radicais de comportamentos táticos, com uma temporada em andamento e jogos a cada três dias, parece a receita do desastre.

Como não existe uma realidade paralela no futebol, não é possível dizer como estaria o Fluminense a esta altura da temporada, caso mantivesse Fernando Diniz. Seja pelo sucesso da última temporada, seja pelos reforços que o clube foi buscar — Thiago Silva entre eles —, há motivos para acreditar que a pontuação baixíssima do início do Campeonato Brasileiro era quase um desvio estatístico que acabaria por ser revertido. Mas tal impressão fica no território da crença. Por ora, resta analisar o mundo real. E, nele, o Fluminense reagiu contrariando boa parte dos manuais.

Os caminhos de Mano Menezes são radicalmente diferentes daqueles de Diniz. E a transformação no estilo de jogo vem sendo feita sob intensa pressão de vencer jogos seguidos, separados por pouquíssimo tempo de treinamento. Diniz acumulava jogadores na saída de bola. Mano, em seus primeiros jogos, sinalizava freneticamente para que nem tantos de seus atletas recuassem para o início da construção. Diniz chamava seu sistema de “aposicional”, fazia da bola a referência para que jogadores aglomerassem e trocassem passes. Mano, longe de ser um pragmático do jogo posicional, tem clara preocupação com a ocupação de alguns espaços.

Diniz entendia que seu modelo permitia reunir jogadores com uma faixa etária mais elevada, privilegiava a capacidade técnica sobre o vigor. Uma das primeiras decisões de Mano foi, gradativamente, dotar o Fluminense de mais pulmão. Nomes como Renato Augusto, Gabriel Pires, Douglas Costa ou Terans passaram a ter menos minutos ou deixaram o clube. Se a chegada de Thiago Silva deu à defesa a estabilidade que só a presença de um atleta de elite mundial é capaz de conferir, a contratação de Serna e a ascensão de Kauã Elias deram ao setor ofensivo elementos de força, arranque e velocidade para um time que tenta chegar ao gol em muito menos passes do que com Diniz. Algumas das vitórias mais relevantes com Mano Menezes, contra Palmeiras, Bragantino, Bahia ou Atlético-MG, o time teve entre 39% e 50% de posse.

Os números mostram como os modelos diferem. No Brasileiro do ano passado, disputado com Fernando Diniz nas 38 rodadas, o Fluminense acertou, em média, 487 passes por jogo. Nos dez jogos da atual edição com Mano, a média é de 393, com uma posse de bola de 51% contra os 62% de média em 2023. Não há fórmula para vencer: com mais posse e passes, o tricolor teve um 2023 memorável; com menos posse e mais verticalidade, vem reagindo num Brasileirão em que pareceu condenado. Pode não ter se tornado, da noite para o dia, favorito ao bi da Libertadores. No entanto, o crescimento no Brasileirão, que se tornara a verdadeira urgência, já permite olhar a disputa sul-americana como uma ambição, e não como uma distração.

Nos dez últimos jogos no torneio nacional, o Fluminense somou 18 pontos. Neste período, o Corinthians e Vitória somaram dez, o Criciúma fez apenas seis, enquanto o Bragantino fez nove. Nas cinco rodadas do returno, só o Grêmio e o líder Fortaleza fizeram mais pontos do que o Fluminense. Tudo aponta para um desfecho sem sustos no Brasileirão, algo impensável há algumas semanas. A montanha já não parece tão íngreme.”