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A Copa do Mundo começa neste domingo com o jogo entre a seleção da casa, o Catar, e o Equador. A última vez que o Brasil venceu foi em 2002 e um funcionário do Fluminense teve papel fundamental. Trata-se do fisioterapeuta Nilton Petrone. À época, o Filé trabalhou muito para dar condições a Ronaldo Fenômeno, principal nome da conquista do penta, a ir a campo na Coreia do Sul e Japão.

— Conheci o Ronaldo em 96. Ele tinha feito uma doença de crescimento que acontece na região da tíbia e deslocou um pedaço de cartilagem para dentro do tendão. Retirou e pediu no PSV para fazer a recuperação no Brasil e fez comigo. Eu lembro que o Ronaldo chegou dizendo: “O Romário me falou que com certeza você iria me colocar em condições de recuperar a tempo”. Ele joga as Olimpíadas e é vendido ao Barcelona. Faz uma campanha espetacular e aí vai para a Inter. Quando começaram a dar os primeiros problemas e eu fui reavaliá-lo, foi quando aconteceu o fato dele perder força, que era fundamental para ele. Sem a manutenção da força, a patela não conseguiria correr corretamente. Lembrando que o Ronaldo tinha displasia troclear, então o movimento que ele faz de muito deslocamento, a patela não tem o trilho, ela fica praticamente solta. Por isso o objetivo era manter a força, para que ela se deslocasse cada vez menos. Ele puxando muito o tendão patelar foi fazendo inflamação, edema… E a doença do tendão é silenciosa, nunca te diz quando vai romper. Eu fiz a reavaliação antes de 98 explicando que ele precisava tomar cuidado, senão a carreira estava em risco – disse à Flu TV.

 
 
 

— Começamos a trabalhar, e o Ronaldo começou a ir. Chega a Copa América em 99, e eu fui chamado para ir junto. O Brasil ganha a Copa América inclusive com gol do Ronaldo contra a Argentina. Pelo rendimento momentâneo estava tudo maravilhoso, mas não é aquilo, é uma sequência. Em novembro, antes do jogo contra o Lecce, chamei ele: “Não vai dar, você perdeu força, não pode jogar domingo”. E ele: “Vou jogar”. Falei pelo menos para diminuir o tempo, e a cada gol que a Inter fazia eu ia no Marcello Lippi (treinador), mas ele cagava para mim. Já estava cinco, se não me engano foi 5 a 2, 5 a 1, alguma coisa assim. Não tinha necessidade nenhuma de dar continuidade para o Ronaldo. Aí lembro que ele matou uma bola e girou, no que ele girou já ficou. Do lugar que eu estava falei: “Rompeu o tendão” – seguiu Petrone, complementando:

— Ele rompeu parcialmente o centro do tendão todo. Falei: “Vai precisar de cirurgia, não vai ter jeito”. O presidente (da Inter) chegou e me perguntou: “E aí?”. Eu: “Não sei, não. Eu vou tentar reabilitá-lo, mas as cirurgias que são feitas no Brasil em casos como esse a orientação é um pouco diferente”. E ele: “Você está dizendo que ele não vai recuperar?”. E eu: “Não estou dizendo isso, só que tem risco de romper de novo e nunca mais recuperar”. Depois de quatro meses e meio ele já treinando com bola, pula, salta, gira, amistoso… E todo mundo rindo de mim, achando que eu era imbecil, debochavam no dia a dia. O doutor liberou para jogar, e eu lembro que era o jogo da Lazio ou da Juventus, a diferença entre um e outro era cinco dias, algo assim. E aí fomos para aquela história que vocês conhecem, que explodiu o joelho. Aí no Brasil começam a falar que acelerou a recuperação. Apanhei igual boi ladrão.

Se no Brasil Nilton Petrone foi criticado pela imprensa, o médico francês que operou Ronaldo o defendeu. Tanto que o Filé acompanhou a cirurgia do ex-atacante no centro cirúrgico.

— Montamos uma programação conservadora demais. Eu, que vi a cirurgia, sabia que tinha que ser muito conservadora. Sabia que era recuperação de um ano, não tinha outro jeito. Oito meses fazendo um trabalho muito estreito, e os outros quatro meses fazendo preparatório para o retorno. Eu lembro que teve uma noite que ele estava muito doido, não sei se por causa da utilização da própria morfina. Ele acorda, olha para mim: “Filé, está aí? Segura minha mão”. O joelho dele estava do tamanho de uma bola de futebol de salão, com três drenos saindo sangue direto. Tinha risco para caramba de infecção porque foi uma cirurgia totalmente aberta. E ele: “Diz para mim que eu vou voltar a jogar de novo”.

Durante a recuperação, a Nike, patrocinadora do Fenômeno, sugeriu levar o craque aos Estados Unidos para ser avaliado pelo melhor especialista em joelho. Mas Filé evitou que ele passasse por nova cirurgia.

— Ele mandou para mim: “Acho que esse joelho vai ter que abrir de novo”. Ah, meu irmão, mas não vai abrir mesmo” – contou o fisioterapeuta que não deixou ele ser operado nos Estados Unidos.

— Ficamos lá 58 dias maravilhosos. Depois voltamos para o Brasil, continuar devagarzinho. Aí o pessoal da Seleção já perguntando. Fizemos janeiro inteiro, em fevereiro ele joga 30 minutos no Criança Esperança. Em março voltamos para a Itália e ficamos até maio. Começa o campeonato, e ele começa a ir. Aí faz a primeira lesão muscular, normal, o sincronismo muda depois de muito tempo (parado). Recuperamos. E vamos para um jogo contra o Brescia, ele faz o gol e é aquela emoção, fica igual uma criança. A gente se abraça, chora. Vi na televisão depois que o gol foi anunciado em todos os estádios, a torcida de todos os times levantaram para aplaudir. Falei: “Esse cara não tem pátria mais, está além de tudo. Não é mais ser de um país, é uma história de sobrevivência”. Recuperou, começou a treinar, treinar, Felipão já começou a ver. Eu deixei a Seleção se aproximar. Um jornalista do O Globo me ligou: “E aí, acha que dá para o Ronaldo?” Falei: “O Ronaldo vai jogar a Copa, o Brasil vai ser pentacampeão, e o Ronaldo ainda vai ser artilheiro”. Nós voltamos (para a Itália), ele jogou os três últimos meses sem intercorrências, ele ainda conseguiu marcar 11 gols no Campeonato Italiano, e quando chegou na Copa já foi com um nível muito elevado para a fase de preparação. Se ele não faz isso tudo, ele não ia conseguir chegar no nível que chegou para a Copa – finalizou.