O blog “Bastidores F.C” hospedado no site Globoesporte.com entrevistou Rubens Lopes. O polêmico presidente da Ferj, embora não admita, se sente vitorioso após a assembleia geral na CBF que homologou a Primeira Liga, mas com exigências. Confira as declarações do mandatário da Federação, inimigo declarado de Flamengo e Fluminense:
A CBF diz que não se opõe à Liga, mas por outro lado fez valer os seus argumentos de que tem de ser feito dentro dos estatutos e das normas. Como o senhor enxerga o resultado dessa assembleia?
– O que a gente era contra? São Paulo contra, eu contra… A ilegalidade da história. Querem fazer tudo a mano militar, não respeitam nada, querem fazer e acontecer, mas as coisas não são assim, senão vira uma bagunça. Aí, a partir do momento que os caras estão dentro da lei, e cumprirem todas as normas, não há porque dizer que a CBF não recepcione. Ou seja, eles são subordinados ao ordenamento jurídico desportivo do futebol mundial que é Fifa, Conmebol, CBF e federações, cada um com seus respectivos estatutos. Eles são subordinados a cumprir tudo isso. A partir do momento que cumprem, não há porque dizer que é contrário ou não. Aí a coisa passa para o cunho político, e não técnico e legal. A assembleia por unanimidade entendeu que a CBF não pode se opor a receber, homologar, a Liga, desde que essa Liga cumpra todos os dispositivos legais do futebol. Pronto.
Mas houve gente saindo da reunião, como o Delfim Peixoto, e dizendo que não acredita que em problema para realizar a competição já em 2016, que são somente necessários pequenos ajustes. O senhor concorda?
– Se ele tem de cumprir todos os estatutos, Fifa, Conmebol, CBF e Federação, não é essa simplicidade. Esbarra em calendário, critério de escolha do clube A ou B…
Mas já avisaram que o critério é o ranking da CBF…
– Não é assim, se a coisa passa pelas federações, não é por aí. Então, em 2016, imagino que não haja chance de acontecer. Para 2017, vamos estudar, conversar, analisar. Desde que eles saiam da ilegalidade, tudo é possível, não digo que aconteça, mas é possível. Eles só não podem ficar na ilegalidade, não respeitam nada, não respeitam ninguém, não vale nada, vale o que eu quero. Basicamente é isso.
Quando se consulta as pessoas da Liga, dizem que já acertaram com a associação de dopagem, com a associação da arbitragem…
– Não serve. A gente tem de começar acertando o que diz o estatuto da Federação. Primeiro: eles têm de ter autorização da Federação, como a CBF decidiu hoje. Segundo, têm de cumprir o que a CBF disse. Há de se cumprir o calendário nacional, que não comporta data para 2016. Exceto se colidir com datas de Libertadores, Estadual e pré-temporada dos atletas, que o sindicato já disse que não concorda. Por isso acho que, para 2016, não é essa simplicidade. Para 2017 pode ser que ajuste porque tem mais tempo para conversar, para acertar as coisas. Eles fizeram o caminho contrário. Quem sabe se lá anteriormente tivessem seguido os trâmites normais, o entendimento pudesse ter acontecido. Só que eles resolveram não falar com ninguém. A lei vai ser a minha. Não é assim que funciona, nesse país ainda tem lei.
Em relação ao racha declarado com Flamengo e Fluminense, existe possibilidade de a Ferj hoje autorizar a participação nessa competição? O que seria necessário para que isso acontecesse?
– Eles não vão porque não querem. Eles têm direito a assento, voz e voto. E a Federação não pode impedir que eles exerçam esse direito. É uma opção de cada um. Eles têm de cumprir as suas obrigações de filiados. Indo para o diálogo, acho que podem encontrar um caminho de convergência. A Federação está aberta a isso, sempre esteve.
Mas houve um diálogo que saiu um pouco de controle, o Bandeira deixou uma reunião dizendo que foi xingado… Como ficou essa relação dali em diante?
– Ele que saiu dizendo isso. Naturalmente não disse o que ele fez para que talvez pudesse possivelmente ter motivado alguma coisa que ele alega.
Mas o que ele fez?
– Tem de perguntar a ele. Se o Bandeira trai, traiu, os seus pares, os que o colocaram na presidência do Flamengo, você acha que ele não vai criar problema para outro?
O senhor foi procurado em algum momento por Flamengo e Fluminense, ou pretende procurá-los para abrir esse diálogo?
– Não. Não fui procurado por ninguém. Eles se ausentaram porque acham que não devem satisfação a ninguém. E o que ficou muito claro na decisão da assembleia na CBF é que eles são obrigados a cumprir os deveres que têm com as respectivas federações e confederações.
Ou seja, são obrigados a ter autorização da Federação…
– Claro, claro.
E o que a Ferj quer para conceder a autorização? Especificamente, o que é necessário para autorizar isso?
– Não é simples, me dá uma autorização e pronto. Depende de uma série de entendimentos, uma série de ajustes. Não pode, em benefício de um, prejudicar a maioria. Como funciona o regime democrático? A maioria decide, a minoria acata. Eles querem subverter essa ordem, implantar a ditadura da minoria. Isso não é democracia.
Mas eles alegam que os clubes de menor porte, que são maioria, não votam contra a Federação por medo.
– Isso é o que eles dizem. Como eles dizem tanta bobagem, mais uma se perde no meio de tantas outras. Eu não quero impor nada. Primeiro é obediência às normas. Precisa conciliar os interesses comuns. Você acompanha. O que não pode é você se insurgir contra o ordenamento que existe, contra as normas, as leis, fazer no peito. Depreciar o produto em prejuízo claro a todos os demais, jogar com infantil, juvenil, uma série de coisas. E achar que tem razão. Querem fazer valer somente as suas vontades, o que não for da vontade deles, não serve. A qualquer custo. Não é assim que funciona.
O contrato de transmissão do Carioca se encerra em 2016 e logicamente será negociada uma renovação. É um ponto chave essa questão de jogar com time principal ou não?
– Eles vão jogar. Sabe por quê? Porque não tem alternativa. Como eles vão explicar para o torcedor, para o associado, que eles propositalmente colocaram a vaidade, prepotência, arrogância, acima da marca do clube? Como vão explicar que expuseram ao clube a uma situação vexatória, talvez? Como explicar colocar um time que possa acumular derrotas e não conquistar títulos? Eles vão jogar. Até porque a torcida vai cobrar. E a televisão também vai cobrar. Ela paga para que a equipe apresente os seus melhores astros. Isso não vai acontecer porque acho que ninguém vai ser imprudente a ponto de expor a marca de um clube importante a situações que não condizem com a história de cada um. São clubes vencedores, não podem ser clubes perdedores.
Supondo que se encontre datas para fazer a competição. A CBF poderia alterar o calendário que ela já divulgou?
– Acho difícil. No meu entendimento, acho que é um risco. Porque fere o Estatuto do Torcedor. Inúmeras federações já fizeram seus regulamentos e calendários em função do que divulgou a CBF. Isso acarretaria uma desorganização tal e o descumprimento do que é pregado pelo Estatuto do Torcedor. Por outro lado, não sei porque do açodamento de realizar a competição em um momento tão conturbado. Isso pode ser amadurecido, conversado. Não vejo nenhum prejuízo nisso.
Conversei com o seu vice jurídico, o Cláudio Mansur, e ele afirmou que se essa posição de fazer o torneio de qualquer forma for mantida, a Ferj pode buscar a Justiça ou a Fifa para barrar. Pode de fato chegar a esse ponto se eles insistirem?
– Acho que não é nem a Federação que vai cobrar isso. Se violar a legalidade, é muito grave. Isso é pregar o descumprimento das leis. Tem sanção, e a sanção é extremamente severa. Jogar no peito eu garanto que não vai. A coragem dos presidentes inconsequentes não vai a ponto de jogar o clube no abismo, de perder todos os seus atletas federados. Isso pode acontecer. A coragem de um presidente, mesmo que haja uma inconsequência, não chega ao ponto de jogar o clube no abismo. A torcida vai cobrar isso.
Mas se a Liga tomar essa posição, a Ferj notificará a Fifa?
– Se acontecer, é uma possibilidade. Mas não acredito que venha a acontecer. É uma hipótese extremamente remota, porque ninguém é louco suficiente para tomar uma atitude dessa. A própria CBF vai ser obrigada a tomar uma decisão. Se ela determina a obrigatoriedade de a competição só poder acontecer cumprindo a lei, se descumprir, ela será obrigada a tomar uma posição. Não preciso nem me posicionar.
Como é a relação institucional hoje com a CBF e a sua com o Marco Polo del Nero?
– Evidente que é uma situação que não é confortável para ninguém. Garanto que os clubes insurgentes também não se sentem em posição confortável, nós também institucionalmente não nos sentimos em posição confortável, e a CBF naturalmente gostaria que tivesse um final feliz. A minha relação com ela é boa, mas a CBF respeita a autonomia que a lei me confere, à Federação. Se ela preza para que seu estatuto seja respeitado, ela não pode tomar nenhuma atitude para que o do outro não seja.
O Del Nero externou alguma preocupação em relação a isso?
– Sempre. E a vontade, de todo mundo, a minha também, de que essas coisas se solucionem. O futebol do Rio de Janeiro sempre foi pacificado, uma divergência aqui, outra lá… Qual pai e mãe que não quer que os filhos se entendam? Então a CBF quer que os filiados se entendam. Reputo como bravata essa história de “vou jogar de qualquer maneira”, “para mim a CBF não existe”, isso é um desafio, uma postura de confronto direto, e tenho certeza que a CBF vai reagir. Se isso acontecer, ela vai reagir.
O resultado da assembleia na CBF foi uma vitória da Ferj?
– Acho que de todo mundo, ganhou o futebol. Foi uma vitória da Federação do Rio, mas como foi por unanimidade, acho que foi uma vitória do país inteiro. É uma coisa muito fácil de ser entendida, ou a lei existe e se cumpre, ou rasga e não se cumpre nada. Vamos para o velho oeste, para a anarquia. Não foi difícil esse convencimento. Esses clubes todos também devem ter se sentido satisfeitos. Não são todos os clubes que estão nessa Liga que têm o mesmo comportamento.
Aquela reunião entre Kalil e CBF acirrou muito essa questão na semana passada. Como o senhor enxergou essa questão? Ele chegou a citar que o senhor estava escondido em outra sala…
– Isso só pode ser fruto de um delírio. Até porque não tenho porque me esconder. Não conheço o senhor Kalil, e não tenho medo dele. Encontro com ele, converso com ele em qualquer lugar que ele queira. É só marcar que eu vou. Não tenho nada com a decisão do presidente da CBF. E, ao que me consta, o presidente da CBF nunca disse que aprovaria. Disse que era simpático à ideia, mas que se entendessem nas respectivas federações primeiro. Mas o que aconteceu lá eu não sei porque não estava lá.
O Feldman deixou muito claro que não pretende dialogar com o Kalil, somente com clubes e federações. A Ferj já foi chamada para conversar?
– Se for chamada para conversar, nós vamos. Quanto ao fato de não conversar com o Kalil, é uma decisão da CBF que deve ter lá o seus motivos, quem sabe justos, pelo menos pelo que se leu que o cidadão falou, acho que possivelmente deva ter razão. Assim como digo que, na Ferj, nesse nível, não teria nem o que conversar.
E com o Bandeira e o Peter, o senhor conversaria para chegar a esse consenso?
– Sempre dissemos isso, a qualquer hora. Não convido o presidente Bandeira para ir na minha casa, não quero ele perto, certamente ele não me chama para almoçar, agora, a obrigação que tenho como presidente da Federação é de que a qualquer momento atender, conversar, dialogar, mantido o comportamento normal. Estou aberto ao diálogo, sempre. E esperamos que a gente consiga pelo bem do futebol do Estado. Nessa assembleia não teve perdedor, só teve vencedor. A bandeira branca está no topo do mastro.