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Recebi feliz o convite do Leandro. Foi algo inesperado. Sou leitor diário do NETFLU desde sua estreia no universo não-gravitacional das fontes tricolores. Nasceu meio com jeitão de clipping, mas logo foi se consolidando como um veículo de opinião, a comprar briga boa e ruim no varejo e no atacado. impôs-se pela recusa em vestir os antolhos dos boçais. Relutei um pouco, pois fazia tempo que decidira não mais assumir compromisso de colaboração com ponto batido e areia correndo apressada pro cone inferior da ampulheta. É assim que corre o tempo – voando baixo – quando o próximo compromisso já chega arfante depois do ponto final do último. Acabei encarando a tarefa. Sou velho o suficiente para acumular histórias tricolores, e não foram poucas que vivi por este mundão das gentes. Por via outra, não sou decrépito o suficiente para delas esquecer.

 
 
 

Vou por aqui contar essas histórias, e uma história pra ser boa tem que ter um pé no chão e outro na nuvem mais alta da imaginança, onde o disparatado se assume oráculo da verdade. História boa trafega inquieta na terceira margem, difusa, entre o real e absurdo, sendo verdade e da verdade debochando. Não esperem análises – “si quieres ser feliz como me dices, no analices, muchacho, no analices”, no bom conselho do bardo catalão Joaquín Bartrini -, para isso já temos muitos outros blogueiros tricolores, ótimos, em sua maioria, e mais capazes que eu para dar cabo do ofício.

Escrever sobre o Fluminense é render-se extático ao épico, ao transcendente, à força cósmica do mais importante bem imaterial do mundo. Não importa se esse mundo seja apenas o meu mundo; sendo meu, é o mundo que interessa. Torcer pelo Fluminense não é ato de monta modesta, é graça, é recompensa, é extasiar-se na alegria hiperbólica e atravessar o martírio com a fúria santa dos profetas. Somos o povo escolhido, e não haverá tragédia, ainda que esculpidas por um Ésquilo, um Sófocles, que nos desviará da realização plena do melhor Paraíso. Ser tricolor é validar a verdade histórica e subverter a verdade temporal pela construção de novas verdades, pois somos a Verdade. Multinuniversal, o Fluminense não se aceita posse de ninguém, e, ainda que dissimulado, guardará para os vaidosos e suas babas hidrofóbicas o lugar de seus flagelos. Eterno, baterá na borda do buraco negro quando a galáxia for sugada, e orbitará no desconhecido com elegância e inconformismo.

Aos apolíneos, aos certinhos, aos cretinos, má notícia: é impossível ser tricolor sem transgredir com a ideologia de vade-mécum, com os tratadinhos de artigos e parágrafos arrumadinhos como gaveta de tecnocrata. Não se é dado ser tricolor sem se exaltar em golpes de ufanismo qual ato bárbaro de um Dionísio dopado.

Aqui se tratará de Fluminense e seu mundo único e múltiplo, material e etéreo. O que se contará será contado com paixão libertária. Se a alguém isso não basta, me desnote e desanote. O que que eu sou? Sou torcedor, sou refém da incoerência, sou carbonário e apaixonado, incabível em régua ou recipiente, sou mais e apenas o que me apresentei no prefácio do libelo tricolor “As Laranjeiras Imortais”, do Marcelo Meira:

“…parideira que esquece a dor do parto possesso e fidalgo algo que não sei antro e da lei bizarro e plausível maior-de-todos estendido contra a massa disforme enorme não dorme acorda a horda cordeiro e onça gentil ou a puta que o pariu abraço o próximo o antes quartel de Abrantes erro berro cerro os punhos maios e junhos e tantos meses vezes xingo vingo quarta ou domingo sábado ou segunda e sonho passado e retardo ou antecipo o futuro a bel prazer desjuro chorando não peço e peço perdão e dou a volta olímpica em cada escuro do meu quarto e parto para exatamente onde estava e recomeço…

O que é que eu sou?

Sou tricolor de coração, sou do clube tantas vezes campeão, porra!!!”.

Prazer, Beto Sales.