Sobre o problema que teve com o Fred, já conseguiu entender o que aconteceu? O que ficou de lição?

Levir Culpi: Não. Não ficou lição. O que eu fiz é o que faço na minha vida toda. Tomei as decisões naturalmente. Às vezes, as coisas não acontecem como imagino. Às vezes, bato na parede, mas fiz o que eu achava que tinha que fazer. E achei que não fiz nada para ter essa repercussão toda. Tive uma passagem com o Fred no Cruzeiro muito legal. Ele fez muitos gols e depois foi para a França. A carreira decolou. E já de saída aconteceu isso aqui. Não sei se alguém colocou no ar alguma coisa dizendo que eu bato de frente com os líderes. Foi uma coincidência muito desagradável, mas se tiver que acontecer amanhã de novo, vai acontecer normalmente. Não foi nada premeditado.

 
 
 

Você ficou marcado como um técnico que bate de frente com as estrelas, como aconteceu com Ronaldinho Gaúcho, Diego Tardelli, Fred…? Concorda com isso?

Concordo, porque aconteceu. Mas foi uma coisa muito natural. Por exemplo, você faz uma substituição, aí o cara sai, vai para perto do banco e dá um chute no microfone, o que você acha que vai acontecer? Vai ficar por isso mesmo? O técnico não vai tomar providência nenhuma? O jogador fica sem treinar de segunda até sexta, e aí quer treinar no sábado e jogar no domingo. Eu falo que não. Aí ele pede para ir embora. Quer dizer… para mim isso é muito natural. Se ele quiser ir embora, ele vai embora. Mas não vai jogar. Não é assim. Mas é um ídolo… mas existe um processo para jogar, existe um respeito. Se tiver que bater de frente… é uma obrigação do técnico. Como que vai passar ordem para um jogador se ele fica sem treinar e quer jogar no fim de semana? Os outros podem não falar nada, mas você passa a perder o comando a partir daí. Os ídolos que têm que dar exemplo. E a maneira não é essa. A maneira é treinar desde segunda e jogar domingo. Eu vejo dessa maneira. É simples.

Acha que a relação com o Fred nunca mais será a mesma depois do que aconteceu? Vai sempre existir um pé atrás?

Acho que não, às vezes uma situação como essa pode até fortalecer a amizade. A partir do momento que o cara te dá um alerta, você discute, mas, na sequência, vê que o cara é um ponta firme, você fortalece. Eu prefiro que o cara me fale logo de saída do que ficar retraído, magoado. Confio mais nas pessoas que jogam aberto. Passo a confiar mais nelas. Guardar mágoa é um negócio chato. Se falar, fica aliviado.

Depois que fizeram as pazes houve alguma coisa que marcou na sua relação com o Fred? Algum momento em que você sentiu que o problema foi superado?

Não. Está tudo normal. Nada de especial.

Não teve nenhuma conversa?

Teve um dia que ele falou “Bom dia”. Aí eu falei “Bom dia, Fred” (risos). Foi interessante.

E os assuntos referentes ao time, a parte tática, por exemplo. Como é o diálogo?

A parte de jogo, sim. Ele tem uma liderança natural. A experiência dele… participa também. Aí temos o Magno (Alves), Gum, Cícero, Pierre… eles participam muito das palestras. Eu gosto de passar os vídeos e mostrar os lances justamente para eles discutirem. O jogador é muito acostumado a obedecer, mas quando participam da conversa conseguem entender melhor. Acho que é melhor explicar dessa maneira.

O Fred sempre foi de cobrar muito dentro de campo nos treinos e jogos. Depois do que aconteceu você sentiu alguma mudança? Ficou mais retraído?

Não. Nada marcante. Não posso dizer que o Fred era de um jeito e agora está assim. Está tudo bem.

Como está a adaptação ao Rio de Janeiro?

É o lugar de mais fácil adaptação que nós temos no Brasil. Todo mundo quer conhecer. É muito fácil se adaptar. As coisas são complicadas, mas todos gostam de estar aqui. Tenho um apartamento no Leblon, mas estou morando em um hotel. O apartamento está alugado e deve vagar dentro de um mês. Se eu estiver no Fluminense ainda (risos), eu pretendo voltar para lá. Mas é bom morar em hotel também, é a melhor coisa. Só saio e deixo as chaves. É muito tranquilo. Estou bem aqui no Rio. Corro na orla bastante. Mas a nutricionista falou para mim que preciso perder cinco quilos para ficar gordinho (risos). Estou meio assim desiludido, mas estou treinando e tentando melhorar. Ai dá pra correr na orla do Leme até o Forte, 4 quilômetros a distância, vou e volto. Está legal.

Em uma avaliação realista, até onde pode ir o Fluminense neste Brasileiro?

Para ser realista, é a conquista do título. Você olha e não vê ninguém muito superior. O Fluminense está muito longe do Santa Cruz, do Palmeiras, do São Paulo? Não está. Estamos em um nível parecido. Então, dá para cravar o título como objetivo.

Para atingir esse objetivo os reforços são fundamentais?

Com certeza teremos alguns reforços. E com certeza somos candidatos. E com certeza podemos ficar para trás também (risos). Tenho certeza de tudo isso que afirmo.

Em qual estágio estão as negociações?

Os jogadores de nível para jogar no Fluminense estão supervalorizados. Nós estamos vendo, estudando há um bom tempo essas situações. Acho possível fechar esse elenco para a temporada. Vai depender mais da parte extracampo do que propriamente das nossas observações táticas. Tem alguns jogadores dentro da disponibilidade, mas é preciso completar a parte financeira. Conversei com o Jorge (Macedo) e o presidente, algumas conversas estão adiantadas. A qualquer momento pode acontecer alguma coisa.

Você indicou alguém?

Estudamos alguns nomes sim. O Fluminense tem observados também, tivemos uma reunião. Mas nem sempre é bom sair do clube esse tipo de notícia. Abre uma especulação danada e depois fica difícil fechara negociação. Mas em breve teremos notícias boas.

Jogadores de nome ou apostas?

Está perguntando muito (risos)… Sem falar o nome, mas vamos comentar. Muito esperto. Vamos ver o que vai acontecer. Estou cansado de perceber isso: às vezes contrata um jogador que seria um ponto altíssimo do clube na contratação, e o contrapeso resolve. Tem que ter convicção na qualidade do jogador que você está trazendo. Fazê-lo jogar. Dentro desse aspecto, se tiver um jogador com as qualidade que nós queremos, não me importa se é muito famoso ou não.

Ainda falta muito para o Fluminense achar sua cara, o equilíbrio?

Falta. Sinto que há essa possibilidade. Vejo momentos bem legais no jogo, mas não temos estabilidade. Outra coisa é conviver com a instabilidade que proporciona um time como o Fluminense. Sabe como? Uma derrota tem que mandar todo mundo embora, os jogadores não prestam, o técnico é burro… Essa bipolaridade é bem característica dos grandes times. A vitória e a derrota muito próximas do céu e do inferno. Temos que conviver com isso enquanto não temos um bom padrão de jogo.

Desde que você chegou, o Flu passou por uma invencibilidade, ganhou um título e teve ao menos duas atuações preocupantes. O que falta para atingir a regularidade esperada pela torcida?

Não existe definição para isso. Não vamos encontrar a resposta. O Brasileiro, para mim, é o mais difícil do mundo. É só tentar descobrir quem é o favorito. São pelo menos dez times com chance de título. Temos que fazer com que o time se encontre durante a competição. Não temos uma equipe  que demonstre credibilidade para ganhar o título agora. Estamos no início do ano e tenho certeza de que o time tem por onde crescer. Sou otimista. Acho perfeitamente possível chegar na ponta do campeonato desde que a gente contrate mais dois ou três jogadores para fechar algumas situações. Isso deverá acontecer rapidamente.

Qual o tamanho do ganho do Fluminense com a inauguração do CT no segundo semestre?

É uma correção de anos e anos de atraso dos clubes cariocas. Acho inadmissível, é uma crítica que faço, clubes com a grandeza dos do Rio estrear um CT apenas agora, como o Fluminense. Isso deveria ter acontecido há 30, 40 anos. Ficaram muito tempo parados. Mas o projeto é grande e legal. Na verdade o CT do Fluminense vai estar muito bem dentro de cinco ou dez anos.

Fale um pouco do Scarpa. Ele te surpreendeu?

Não me surpreendeu. Eu já tinha ouvido falar dele e o vi mais de perto depois que cheguei. Acho que ele tem ótimas condições, uma finalização ótima, bola parada, dinâmica boa de jogo também. É um diamante que está sendo lapidado. Vai depender muito da regularidade dele.

Ainda tem disposição e saúde para aguentar o futebol por muito tempo? A família pede para parar?

Sinto que tenho arritmia, mas estou controlando a pressão, essas coisa da idade. Procuro me controlar. Uma coisa boa que o futebol me deu é que nunca tomei bebida alcoólica enquanto jogava e nunca fumei. Depois que parei de jogar, provei algumas bebidas, mas pouquíssimas. Até hoje eu tomo vinho apenas. Tomo remédio para pressão, para arritmia. Essas coisas. A família não tem essa autonomia toda para me fazer parar (risos). Lá em casa só me cobram muito sobre sexo (risos).

Como foi a repercussão daquela entrevista em que você disse ser uma ”Máquina de sexo”?

É bom brincar, né? Brincar é uma das boas coisas que temos na vida. O politicamente correto fica muito chato. Quando ouço algumas notícias, entrevistas, vejo que está se cuidando para não falar nada errado, para não ser politicamente incorreto. Isso irrita um pouco. O cara se prepara todo, faz a barba, tem que estar com o nó da gravata bem feito. É chato isso, quanto mais natural é melhor. Para tudo, mesmo para resolver coisas importantes.

Em casa você também é muito brincalhão? A esposa vira alvo das piadas também?

Também. Ela já sabe. Nos somos casados há 40 anos, não tem mais como brigar. A melhor coisa do mundo é isso, eu sou um marido perfeito. Sabia? Porque não fico muito em casa. Viajo muito. Então, não incomodo muito. Sentimos sempre saudade.

Durante a premiação da Primeira Liga, você disse que a sua esposa é quem escala o time…

Ela escala tudo. A casa… Mas ela fala pouco sobre futebol. É engraçado… Minhas filhas também. Meus filhos e meu irmão mais velho cornetam mais. Lodércio o nome dele. Meus pais colocaram o nome do filho mais velho de Lodércio, que tem doutorado em genética. Com um nome desse também… Dr. Lodércio Culpi. O segundo irmão, o que faleceu, era Lodair. Aí eu vim como terceiro… Levir, com “r” no final. Um absurdo que ninguém consegue explicar lá em casa. Aí depois nasceu nossa irmãzinha, a Leodete… também não existe, né? Todo mundo chama ela de Dete. Meus pais resolveram colocar esses nomes. Somos italianos e nascemos em uma colônia em Santa Felicidade, Curitiba. Ninguém consegue explicar de onde tiraram estes nomes. Eu coloquei o nome das minhas filhas Janaína e Maíra, mais brasileiros, mais tranquilos.

Após a Primeira Liga você também disse que nunca havia trabalhado com um elenco com jogadores tão feios quanto os do Fluminense… Nenhum se salva?

Se esses meninos não fossem jogadores sabe o que eles seriam? Virgens (risos). Nenhum se salva.

Você também costuma fazer comentários sobre o atual momento político do Brasil e brinca que é da República de Curitiba. Qual a sua visão do cenário nacional atualmente?

Estou preocupado e chateado. Nós não temos para quem torcer. Só queremos que tirem os corruptos, mas não temos para quem torcer. Quem que vai entrar?  O cara que vai entrar já está processado. É um negócio incrível. Não me lembro de ter visto um momento parecido com esse. Temos que depositar confiança num cara que vai entrar e que vai responder processo. Sinceramente, estou um pouco desiludido. Não sei o que vai acontecer.

omo é o Levir em casa, o Levir avô?

Brincalhão. É muito bom pegar o netinho. O meu agora tem oito meses. É um gênio, sabia? Ele já está ficando em pé, ele já fala ‘Ah’ e as pessoas lá em casa dizem: ”Olha, ele está falando”. É maravilhoso. Nunca vi isso, o menino não faz nada além do normal, mas é um gênio, uma paparicação enorme em cima do David.

Você certa vez disse que queria ter sido cantor e, como não conseguiu, queria que o seu netinho fosse…

Eu chamo ele de Pavarotti. Ele tem uma garganta. Nunca vi alguém chorar tão alto. Imagina um tenor assim lá em casa?

O que faltou para ser cantor?

Voz (risos). Só isso.

Se você fosse escrever em seu próximo livro o título do capítulo desta sua ainda curta passagem pelo Fluminense, qual seria?

Tem muita coisa… Por exemplo, um capítulo eu já marquei foi o Fla x Flu no Pacaembu. Imagina… um Fla x Flu no Pacaembu. Esse ano pode ser de bons capítulos. Eu tenho uma espécie de um diário que vou escrevendo as coisas que fazemos, aí já vou apontando algumas coisas. Tem coisas interessantes. Um fato pitoresco é que ainda não jogamos no Rio de Janeiro neste ano ainda. Sempre fora. Ficou um ano atípico. Será um grau de dificuldade a mais.

E o episódio com o Fred, não vai valer um capítulo próprio?

Por incrível que pareça, ele está no capítulo do meu livro que escrevi em 2011. Ele já jogava no Fluminense. Eu estava no Japão e ele, junto com o presidente da Unimed (Celso Barros), se não me engano, me ligaram para ver se eu poderia treinar o Fluminense. Tenho um capítulo sobre isso. Foi justamente quando houve o terremoto no Japão e teu tinha dado uma declaração de que a gente precisava ficar unido, permanecer no país… Aí falei: “Pô, se eu for para o Fluminense depois de uma declaração daquela, fica meio chato. Não posso sair. Vou ter que ficar. Mesmo com medo”.

O fato de o Fred ter te ligado em 2011 mostra o quanto esse problema agora foi estranho?

Não sei pediram para ele ligar. Não sei se deu um “piti” no Fred. De vez quando baixa o Cabloco Mexerica e fica fora da casinha. Não sei o que houve. Mas em mim também baixa de vez em quando. Faz tempo que não. Vocês tomem cuidado com as perguntas que fazem (risos).