O Fluminense recusou R$ 11 milhões anuais da Caixa Econômica Federal no ano passado, após longa negociação, alegando que as contrapartidas exigidas pelo banco acabariam sendo um mau negócio para o clube. No mês de fevereiro de 2017, o NETFLU informou em primeira mão a desistência de um acordo entre as partes. Nesse sentido, supostas obrigatoriedades como transferência das transações financeiras apenas para a estatal, além da necessidade pela manutenção das certidões negativas fizeram o Tricolor recuar. Nem tudo, porém, era o que parecia.
Quase um ano depois, o site número 1 da torcida tricolor teve acesso a informações sigilosas, que desmentem o que fora largamente exposto, inclusive na última semana, pelo diretor executivo geral do clube, Marcus Vinícius Freire. Para entender melhor os argumentos do clube, basta relembrar as palavras do CEO, durante o anúncio da nova patrocinadora, a Valle Express, empresa de cartões de crédito.
– A Caixa, hoje, é quem precifica as camisas do clube. Ela tem 14 de 20 clubes e mais 13 da Série B. Quase 30 clubes e ela que dá o preço em função das análise que ela faz. Tem uma empresa que a auxilia. Número de torcedores, engajamento social… São 12 itens. Esse nosso acordo com a Valle (Express) é melhor do que o que eu pude conversar com a Caixa. Estive pessoalmente com o diretor da Caixa. Lembrando que eles estão reduzindo o investimento este ano. Esse valor é melhor do que a Caixa nos deu, principalmente em relação às obrigações que a Caixa dá como contrapartida, que não são poucas – declarou.
Na mesma toada, o principal grupo político do Fluminense, base de apoio ao presidente Pedro Abad, a Flusócio, fez coro às declarações de Marcus Vinícius Freire. De acordo com eles, as exigências transformavam a parceria num negócio arriscado.
– Como disse o CEO Marcus Vinícius Freire na coletiva de imprensa que apresentou a parceria, é importante frisar que o valor líquido a receber anualmente será maior que o valor líquido oferecido pela CEF (Caixa Econômica Federal) no ano passado. Isso porque a proposta da CEF tinha inúmeras contrapartidas por parte do Flu, sendo as mais complicadas a exclusividade do banco estatal para todas as operações financeiras do clube, além da obrigatoriedade de montar um time de futebol feminino antes do prazo limite estipulado pelo Profut – dizia trecho publicado no dia 20 de janeiro deste ano no Blog da Flusócio.
As discrepâncias entre o discurso da gestão tricolor e as informações de documentos sigilosos que servem como base para os contratos elaborados pelo banco são enormes. Diante deste cenário, existem três grupos de contrapartidas que o clube precisa cumprir. Os dois primeiros são no contexto do marketing e o terceiro é no âmbito negocial.
Os cumprimentos de contrapartidas de marketing são: a localização da marca da empresa, bem como o tamanho das logos, tanto nas costas e no peito, como no calção; localizações de banners, backdrops e placas de publicidade. Já o segundo item é a tabela de metas. Nela são estipuladas premiações por resultados conquistados, ou seja, títulos. Num contrato do porte do que era negociado entre o Fluminense e o banco, além dos R$ 11 milhões, o clube poderia receber pelo menos mais R$ 5 milhões, caso vencesse alguma competição de relevância nacional ou internacional.
Curiosamente, os pagamentos não são mensais. Eles são feitos por meio de transferência a cada três meses, em média. A primeira delas é na assinatura do contrato. Essa é a única cota que não requer o cumprimento das contrapartidas para ser validada. Outras contrapartidas a nível de marketing, negociadas clube a clube, são a liberação de 100 camisas por mês, 50 produtos licenciados, 100 ingressos por jogo e um camarote para 20 pessoas, a serem distribuídos para clientes da Caixa Econômica.
O principal motivo da negação do Fluminense é contestado agora. No item de relacionamento negocial consta a exigência no direito de PREFERÊNCIA nos negócios bancários. Não é obrigatoriedade. Isto é, em nenhum momento foi exigido ao clube das Laranjeiras que se transferisse todas as transações financeiras para a Caixa. O banco dá a condição de negociação de quaisquer taxas, caso o Flu prove que tem uma oferta financeiramente melhor de um concorrente. Portanto, até negociações futuras visando questões bancárias poderiam ser mais interessantes. Juridicamente, é considerada uma cláusula leonina oferecer exigências que prejudiquem uma das partes. No contrato de prestação de serviços da Caixa, sequer, vem sinalizado taxas. Tudo é variável.
A Caixa Econômica Federal tem por prática não se manifestar sobre temas que envolvam patrocínio. Na época do flerte entre o banco e o Fluminense, questionava-se os R$ 11 milhões, já que a proposta seria para calções, peito e costas. Também havia confiança da gestão em fechar com a TCL ou Huawei, gigantes chinesas de telecomunicações. Nada disto ocorreu.
Outro tema importante é que a Caixa não tem linha de crédito para time de futebol. Mesmo que o cliente queira dinheiro, não poderá tê-lo. Não há linha de crédito comercial ativa com nenhum time que ela patrocina. Todas as operações que clubes fazem como empréstimos e antecipações não são com a estatal.
Ainda há um item que pede o aumento da plataforma de negócios com a Caixa. O que significa? Se empregados não recebem pelo banco e o clube passa a folha de pagamento para a Caixa ou combina de fazer 50 cartões, por exemplo, para funcionários ou jogadores, esses termos serão debatidos paralelos ao contrato.
E mais: nunca houve exigência para a criação de time feminino de futebol, como a Flusócio descrevera. No primeiro item diz que o clube precisa ampliar em uma modalidade o seu hall desportivo. Qualquer área conta, como o vôlei ou natação, por exemplo. Não é obrigatório que seja no futebol. Por fim, o Fluminense também poderia alegar que não havia como ampliar seu hall, caso fosse provado.
Talvez a questão mais polêmica, as certidões exigidas pelo banco são: Regularidade fiscal junto à Receita e junto à Procuradoria Geral da Fazenda Nacional; certidão de regularidade fiscal do FGTS; certidão de regularidade da Fazendo Pública Federal, Estadual e Municipal; Cadim (Cadastro de Inadimplentes); certidão negativa de débitos trabalhistas. Na prática, porém, o simples fato de acontecer atrasos salariais não inviabiliza a amarração contratual. A Caixa Econômica, como órgão público, possui algumas regras que não podem descumprir. O fato de o Fluminense estar com débito não vira impeditivo de pagamento, a não ser que a situação se transforme em certidão positiva, o que não acontece via de regra. Dois meses após as eleições, onde o grupo de situação carregou o discurso de contas equalizadas debaixo do braço, os temas já preocupavam porque sabiam o que estaria por vir: a perda das CNDs (certidões negativas de débitos).
O NETFLU entrou em contato com o clube para ter ciência sobre as certidões, mas não obteve respostas após aguardar três dias por elas. Dois meses depois da primeira recusa, em abril do ano passado, o Fluminense voltou a abrir diálogo com a Caixa, contudo, sem sucesso outra vez. A pá de cal na possibilidade de parceria aconteceu quando a ThinkSeg, concorrente do banco estatual na área de seguros, fora anunciada na parte de trás da camisa. O curioso é que o valor negociado foi bem abaixo do mercado, em torno de R$ 50 mil mensais.
Para base de comparação, os R$ 11 milhões que o Fluminense deixou de ganhar na temporada passada poderia ter pago todos os débitos com Gustavo Scarpa (o meia cobra R$ 9,3 milhões na Justiça), evitando a perda do jogador mais valorizado do clube, sem custos, para o mercado. Agora, o Tricolor aposta as fichas na empresa de cartões de crédito, Valle Express, nova no ramo. Com mais de 500 mil clientes, está disposta a desembolsar R$ 20 milhões por dois anos de contrato, além de comissão a cada cartão feito a partir da parceria.