Romário diz que Fred é merecedor de todo o reconhecimento que está recebendo nos seus últimos dias como atleta profissional (Foto: Marcelo Gonçalves - FFC)

Existe um clube neste país que é maior que todos os demais. E aqui não falo de títulos conquistados, de torcida mais numerosa, de tempo de exposição na TV, de milionários patrocínios estatais, nada disso.

Existe um clube neste país maior que todos os demais porque é o único que foi morto e depois ressuscitou. Ressuscitou, eu disse. É o time para o qual torço.

 
 
 

É o que você leu, meu amigo e minha amiga: o Fluminense foi morto pelos barões do jogo. Morte lenta, calculada. Enquanto outros clubes recebiam benesses do estado, terrenos, estádios, dinheiro, o Fluminense cortava a própria carne para abrir uma rua, onde existia seu campo de jogo.

Enquanto o clube servia de berço para o futebol brasileiro, repartições, redações e renomados jornalistas tratavam de taxá-lo de elitista, racista e burguês.

Num átimo, viramos o clube do tapetão, da virada de mesa, o vilão que rebaixou adversários por uma escalação de jogador irregular num jogo que nem lhe dizia respeito. Mataram-nos. E nos impuseram uma conversa frente a frente com o diabo.

Mas não dobramos joelhos. Para espanto de todos, a ressurreição aconteceu. Não no terceiro dia, mas na várzea da terceira divisão, de onde saímos para ganhar dois brasileiros algum tempo depois.

Eles seguem, no entanto. Para eles, nossa torcida só faz diminuir, nosso tempo na TV não passa de alguns poucos minutos, nossa parte nos jornais quase sempre são pequeninos retângulos de notícias desagradáveis.

Como é chato escrever “Fluminense Campeão” pra essa turma de redações lideradas por engravatados que trocam jornalismo por audiência e que, enquanto abrem seus uísques, tentam definir quem é grande e quem não é no futebol brasileiro. Coitados. Deram de cara com o Fluminense.

E hoje têm que falar do Fred. Porque não existe ninguém maior que o Fred no futebol brasileiro. Mas antes de falar do Fred, permitem uma pequena volta no tempo?

Olhem, amigos, gerações de brasileiros cresceram ouvindo as histórias do Maracanazzo. Pouco importa que pra ser da seleção um cara precise jogar mais que um país inteiro. E daí? Temos que achar vilões, não é?

Barbosa, o goleiro de 1950, morreu triste, assombrado pela covardia. Foi humilhado por gerações de brasileiros, perseguido porque era o cara que queriam crucificar. Como perder uma copa em casa? Que ousadia era aquela?

Então, veio 2014. Que bom que a vida dá uma segunda chance! 64 anos depois o Brasil seria campeão naquele mesmo Maracanã. Não seria? Pois é, não foi. A ‘segunda chance’ ficou na semifinal.

“Um outro Barbosa! Um outro Barbosa!, gritavam os engravatados nas redações, ainda antes do sétimo gol.

– A cabeça do Fred numa bandeja! Agora! Liguem pros editores da TV. Vamos chamá-lo de Cone.

E aí, meus amigos, operou-se o grande milagre, o grande paradoxo do futebol! O ótimo atacante, que, de fato, assim como o time todo, não fez uma grande Copa, começou a se tornar o maior atacante do mundo. Porque também foi morto.

“Um novo Barbosa! Um novo Barbosa”!, eles repetiam! E porque TAMBÉM ressuscitou. E aí, meus irmãos de arquibancada, aí era hora do Fluminense.

O cara foi recebido com abraços, com festa. E retribuiu com corações imaginários jogados pra torcida. E com gols, inúmeros gols. O resto da história vocês sabem.

Fred se tornou o maior ídolo da história pós ressurreição do Fluminense. O maior! Mas ainda assim, 199 gols depois e seguiremos tendo que discutir com os não tricolores sobre sua grandeza. E responder sobre os títulos que não trouxemos  com ele em campo.

Ahahahahah. Como se fosse sobre isso.

Eu escrevo com segurança: futebol é pertencimento. É campo de afeto. É construção de memória. Bicampeão brasileiro, bicampeão carioca, maior artilheiro disso, maior artilheiro daquilo. Ótimo.

Mas o troféu do Fred que realmente importa é sua imortalidade.  Quem a tem? Quem a testou?

Pois a imortalidade estava ao meu lado no Maracanã do último sábado, quando minha filha – que não viu os títulos de 10 e 12 – chorou emocionada com o gol do nosso 9, como que canalizando aquela energia incrível do Maracanã, que ela pouco entendeu, mas sentiu nos pelos arrepiados do braço.

– Esse daí é o Fred, filha. Está se aposentando, não consegue mais jogar como jogava. Deram como morto, foram muito covardes, botaram o país inteiro contra ele, mas olha lá. Olha o torcedor em volta da gente! Todo mundo ama esse cara”.

– Por que, papai?

– Por que? Porque ele é o maior atacante do Brasil”

– Olha o gol! Olha lá! Fluminense, porra!

A quantidade de crianças naquele Maracanã de sábado foi um delicioso milagre. Só não viu quem não quis. O milagre da imortalidade não estava apenas ao meu lado. Pulsava sob toda a marquise.

E é sobre isso, amigos, sempre foi sobre isso. Perenidade, encantamento e perpetuação. O maior clube do Brasil não se despede do maior atacante do Brasil. Essa é a manchete que vocês não vão ler no domingo.

Nossa história interessa demais a todos. E por isso mesmo é contada de outra forma, como já explicou o tricolor Luiz Carlos Máximo, um dos autores do samba da Mangueira de 2019.

Valeu, Fred. Obrigado, em nome de tanto tricolor que ainda vai ouvir falar de você como referência viva do que representa o clube que você amou e pelo qual foi amado.

Nossa arquibancada cuidará de tudo. Deixa com a gente agora.

É Fred eterno, sim! Seguimos daqui. E olha… Bem mais fortes depois desses anos contigo.

Abraços tricolores!