Foto: Nelson Perez/FFC

O modelo moderno de jogador da base virou uma epidemia. São popstars desconhecidos, feiosos com vaidades, funcionários iniciantes já com mentes milionárias. As crias de Xerém não seriam diferentes. Os fones de ouvidos gigantes dão o tom a indumentária, composta ainda por bolsas de marcas famosas (muitas ainda falsas) e botinhas afeminadas de canos longos. Mas a generalização sempre deixa uma sorte ao azar. Uns poucos são meio que imunes ao estrelismo deliberado do futebol. Nas Laranjeiras, um deles começou a aparecer pela qualidade nos gramados antes que pelas baladas fundamentais da formação. Quem ainda não percebeu que Gustavinho Scarpa é fora dessa curva?

Nos tempos em que trabalhamos juntos, o meia passava quase que imperceptível nos vestiários. Muitos foram os treinos em que vinha apenas para servir de saco de pancadas. A rapaziada da cabeça de área era Valencia, Diguinho, Jean e Edinho. Ou seja, machado de sobra. Mas e os outros? Os outros eram bibelôs. Robert era joia, Gerson joia, Matheus Carvalho e Marcos Júnior já eram promissores, mas e o Gustavo? Era um excelente meia reserva da base. E sempre foi assim. Em todos os torneios da base ele roeu o osso. Os que já foram listados acima, e outros mais, já se mesclavam com o profissional, viajavam, concentravam no Rio e já passavam por um processo de ambientação. E o Scarpa? Abraçava todos os torneios em que o pessoal da base ia se matar. Campo ruim, viagem longa, visibilidade pouca. Mas bota ele lá. E às sextas? Tinha as porradas do profissional esperando no coletivo. Mas ele nunca me pareceu preocupado. Sempre entrando mudo e saindo calado. Para se ter uma ideia, só fui descobrir que o Gustavo tocava violão em uma matéria do Globo Esporte na TV.

 
 
 

Mas e o lado técnico, a atuação? Scarpa tem uma capacidade muito interessante. Ele costuma fazer exatamente o que se espera dele. Nunca me pareceu genial, mas sua regularidade sempre foi presente. Acho que essa característica ainda ganhou pontos favoráveis com sua trajetória. Gustavo não queimou etapas. Enquanto Roberts da vida já ganhavam salários muito acima da média para as categorias de base, Scarpa participava de todos os torneios possíveis da base e ralava no sol quente de Xerém. Talvez seu estilo o tenha ajudado. Nada de pedaladas, reboladas e malabarismos. Aí não chama atenção. Mas a batida na bola extremamente aplicada, o passe sem firulas e preciso e a entrega de jogador moderno o tornam uma das melhores relações custo-benefício do Fluminense nos últimos anos. Talvez se ele desse um elástico poderia virar carne fatiada igual ao Wallace, o Pernão, o Kennedy. Todos usados como moeda de troca para a vinda do Deco. Aliás, os salários pagos em libras não fizeram muito bem ao futebol deles não. O Kennedy ainda está no foco, mas os outros não renderam o esperado. Mais um assassinato de dirigentes que tratam jogador como frutas da feira.

Para a sorte de todos, Scarpa escapou dos holofotes no início. Mas agora, com sua aplicação já brilhou. E aí vira o que? Vira produto da feira. Já se busca um caminho para a sua saída e a volta da farra do dinheiro. Pelo menos esse ainda dará muitas alegrias por aí. Independente do destino, aonde jogar vai mostrar que lugar de palhaço enfeitado é no circo.